Jornalismo de cultura pop com um jeitinho brasileiro.

Ainda Estou Aqui já é o grande vencedor

O filme estrelado por Fernanda Torres é mais do que apenas um foguete de hype em forma de tapete vermelho

Por VINICIUS CARLOS VIEIRA*

O Oscar não é ignorável. Simples assim. Você pode até exercitar a sua falta de esperança e um certo niilismo para se proteger de possíveis decepções mas, independente de sua força de vontade, o Oscar continua sendo importante para o cinema mundial e, principalmente, para lugares como o Brasil, onde em menos de 40 anos, houve um esforço brutal para destruir a produção de cinema no país – e DUAS vezes!

Dito isso, Ainda Estou Aqui já está indicado ao Oscar e será visto e reconhecido pelo mundo inteiro. Mas não ganhará a estatueta. Azar do nosso cinema, que chegou por lá no dia errado e na hora errada. Mas será de uma importância enorme essa indicação. Portanto, a vitória também estará na hora de ver o novo filme de Walter Salles entre os indicados na noite mais importante do cinema mundial.

“Mas não é a mais importante, o Oscar é apenas uma celebração do cinema americano, o cinema nacional é maior”.

Sim, essa voz aí interrompendo o meu texto está correta, o cinema nacional é BEM maior. Porém, não ser importante e só celebrar o próprio quintal é, justamente, o erro de julgamento que impedirá Ainda Estou Aqui de ganhar o Oscar.

“Mas quem disse isso?”, lá vem a voz de novo.

A lógica é que diz isso. Enquanto o jornalismo brasileiro se especializou em futebol, imagine que nos Estados Unidos o mesmo peso é dado para o cinema. Portanto, se você viu algum comentarista de um canal de esportes acertando os campeões do ano por pura lógica e análise da história recente dos campeonatos, é possível fazer o mesmo com o Oscar. E o que eles estão dizendo sobre o Oscar 2024? Que Ainda Estou Aqui não vai ganhar, mesmo com ou sem sua torcida.

Entre os queridinhos do cinema no ano e lutando para ser o azarão de 2024 entre as megaproduções blockbusters como Duna 2, Wicked e Gladiador, sempre aparecem dois filmes pequenos em seu reconhecimento pelo grande público (ainda) mas que, em comum, não falam inglês como língua principal: o franco-belga com cara de mexicano Emilia Pérez e o alemão falado em iraniano (persa) The Seed of the Sacred Fig. Parece que qualquer previsão que surge nos principais sites e mais importantes revistas de Hollywood colocam esses dois como indicados a Melhor Filme. O que é um problema para as esperanças de Ainda Estou Aqui.

Por sua vez, é quase uma constante maior ainda o filme brasileiro aparecer entre os indicados a Melhor Filme Internacional. Portanto, a vaga é nossa, mas a estatueta deve acabar com um dos dois.

Só que, dessa vez, diferentemente das outras vezes que o Brasil foi indicado, o momento é outro. O que antes era o resultado de cinema que estava caminhando por uma retomada, agora Ainda Estou Aqui é quase um posicionamento sociopolítico. Se a ideia era destruir o cinema, o nome do Brasil no Oscar demonstrará o quanto essa tentativa espúria foi em vão. Melhor ainda, esfregando na cara desse pessoal as dores e violência daquilo que eles achavam (e imbecilmente ainda acham!) digno de homenagem.

Um filme político como Ainda Estou Aqui chegando no Oscar é uma bandeira hasteada contra essa parcela burra e vergonhosa que continua lutando contra o Brasil escondido por trás de um patriotismo de araque.

Pondo fim nesses parágrafos empolgados e panfletários e voltando ao cinema, o resto do Oscar vai se manter sem muitas surpresas.

Anora, ganhador da Palma de Ouro em Cannes, deve se meter no meio dos “grandões”, junto com Conclave, que parece ser bem “americano”, mas é dirigido pelo mesmo Edward Berger que chegou ao Oscar de 2024 com seu incrível (e alemão) Nada de Novo no Front. Há quem arrisque até que o Bob Dylan de Timothée Chalamet em Um Completo Desconhecido tenha chances de aparecer entre os indicados, junto com o novo filme de Pedro Almodóvar, O Quarto ao Lado. E tudo isso está tão longe de ser só um chute que todo mundo já pode até fazer umas apostas.

Isso acontece porque Hollywood funciona à base de lobby. Simples assim.

É como se ninguém no cinema dos Estados Unidos fizesse nada sem um empurrãozinho, um “quem indica” qualquer, ou alguém mais famoso carregando os outros menos famosos pela mão. Por isso mesmo que Ainda Estou Aqui está tão perto de uma certeza: lobby. Ao que tudo indica, a Sony está realmente apostando no filme, então seu nome, seus realizadores e atores não param de aparecer nas festas, entrevistas e exibições que “abrem” a temporada de premiações. O filme de Walter Salles talvez esteja até sendo mais visto que boa parte de seus “adversários”, o que deixa até aquela pontinha de esperança.

Mas talvez não seja tão necessário assim se preocupar tanto com isso. Afinal, Ainda Estou Aqui já venceu. No Brasil completou duas semanas em primeiro lugar nas bilheterias e deu uma surra enorme em Wicked e Gladiador II. Melhor do que isso, está sendo conversado, discutido e criticado. Mais importante ainda, está sendo defendido.

E se Ainda Estou Aqui não vai ganhar o Oscar, já que vai competir com dois filmes que estarão entre os indicados a Melhor Filme e pela lógica eles ganham, o filme brasileiro já é o grande vencedor de 2024 para o Brasil. Para o cinema nacional demonstrar que não só não morreu, como está fazendo história.

Tudo bem, ignorem o Oscar e vão assistir Ainda Estou Aqui que é muito mais importante que esse prêmio americano só preocupado com o cinema americano. Pronto, me empolguei!

Aproveite e leia minha crítica sobre Ainda Estou Aqui.

——

* Editor, criador e crítico do CinemAqui, jornalista por formação, escritor por definição e chato por natureza. Viu filmes demais e leu mais quadrinhos do que devia, o resultado foi essa vontade de discutir, entender e se emocionar com ambos. Se tornou crítico de cinema pelo amor à Sétima Arte e continua a cada dia ainda mais apaixonado por cada frame, quadro, quadrinho ou linha escrita.