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Splendor Blues

Splendor Blues: uma heroína que enfrenta uma imensa luta por dentro

Criação de Marcelo Saravá, a HQ online Splendor Blues é estrelada por uma justiceira uniformizada que enfrenta suas próprias questões de saúde mental enquanto combate o crime em Forta Beach

Por THIAGO CARDIM

A plataforma de gibis online Webtoon, conhecida pelo gigantesco fenômeno conhecido como Lore Olympus (obra de Rachel Smythe que inclusive acaba de ganhar publicação impressa no Brasil), tem espaço aberto para tudo quanto é autor e de todas as partes do mundo. Portanto, sim, também tem HQ nacional por lá, como é o caso de Splendor Blues, obra criada por Marcelo Saravá, que divide os roteiros com Zé Wellington (Cangaço Overdrive) e traz ainda desenhos de Débora Santos (Luzia), cores de Débora Santos e Talles Rodrigues (Mayara & Annabelle) e letras de Deyvison Manes (Cebolinha – Recuperação).

O mais legal é que a trama, ambientada na cidade fictícia de Forta Beach, poderia ser uma daquelas clássicas histórias de super-heróis, com monstros e vilões pra todos os lados. E, só por isso, já seria bem divertida. Mas existe uma camada a mais nesta conversa. Porque Esplendor, a super-heroína que protege e inspira a todos na cidade, em certos dias de sua vida simplesmente não consegue nem sair da cama. Porque ela sofre de depressão. E é aí que as cenas de ação dão lugar a sequências bem mais complexas… ilustrando uma luta ainda mais difícil.

“O ninguém sabe é que Camila Koto, o alter-ego da Esplendor, vive uma de suas batalhas mais difíceis quando está fora de seu uniforme colorido”, explica Marcelo, em entrevista pro Gibizilla. “Uma batalha contra seus sintomas depressivos e pela sua saúde mental. Splendor Blues é uma história sobre tentar continuar se mexendo dentro desse sistema em que vivemos, que gira em torno da produtividade. Lidar com a saúde mental já é algo difícil, mas fica ainda mais quando as pessoas a sua volta acham que sua incapacidade de trabalhar ou estar com outras pessoas é só frescura ou mimimi”.

Um inimigo que chega sem pedir licença

Segundo a OMS, Organização Mundial da Saúde, a depressão afeta mais de 300 milhões de pessoas no mundo. A maior parte da população não consegue compreender as consequências no comportamento de quem sofre com o transtorno, o que torna a conscientização tão importante. “Com apoio e tratamento adequado, ela vai embora”, explica Débora Santos, desenhista da série. “Queremos falar sobre isso numa linguagem apropriada aos jovens, daí a ideia de tratar essa doença no mundo dos super-heróis”.

Este é o primeiro trabalho de Saravá após o Troféu Jabuti de melhor HQ de 2021 por META – Depto. de Crimes Metalinguísticos (cujo volume 2, aliás, está em financiamento coletivo no Catarse). Figurinha carimbada dos quadrinhos independentes, o roteirista participou até do lendário coletivo Quarto Mundo. “Já escrevi também para cinema, TV, teatro e publicidade e agora estou encarando um novo desafio com um estúdio de desenvolvimento de games, o Black Moluska”, explica.

Splendor Blues
Splendor Blues

Mas a inspiração para Splendor Blues surgiu, na verdade, de um drama real – a partida precoce do ator Robin Williams. “Quando ele morreu, eu soube que ele lidava com a depressão. Isso deu um nó na minha cabeça, não fazia sentido alguém tão intenso e cativante ter lutado a vida toda contra essa doença”, revela o autor. Afinal, pessoas com depressão saem pra trabalhar, vão ao museu, sentam no cinema com um baldão de pipoca e um aparente sorrisão no rosto. Mas, no fundo, lá dentro, não está NADA bem. Então, surgiu a ideia de trazer esta discussão para o cotidiano de uma heroína que chuta as bundas de tatus gigantes e surfistas zumbis.

Marcelo conta que, dentro da equipe de trabalho, existem pessoas que já lidaram com sintomas depressivos e, portanto, essas experiências pessoais foram o primeiro mapa para a história. “Além disso, nos preparamos muito na fase de pesquisa. Eu entendo que esse assunto exige uma certa delicadeza e sensibilidade e sempre quisemos que essa fosse uma história que não despertasse gatilhos”, revela. A busca foi por algo que precisava ser divertido de alguma forma e apontar para a direção de que, com tratamento adequado, uma pessoa com depressão consegue levar aquilo que se chama por aí de “vida normal”.

É hora do chamado para a ação!

Além de seu tema importantíssimo, Splendor Blues aposta na cenas cheias de adrenalina porque faz parte da iniciativa Call to Action – uma competição que, como o nome entrega, exigia que a história tivesse pelo menos uma sequência de luta entre dois personagens. Serão 10 vencedores concorrendo a prêmios em dinheiro, cujo anúncio acontece agora no final de setembro. “A decisão sobre quem vence vem em parte de um grupo de jurados do site, mas conta também o engajamento dos leitores, por isso pra que a gente tenha chance nessa disputa precisamos muito do apoio dos leitores, com curtidas, comentários e compartilhamentos da série”.

Atualmente, a HQ tem apenas o episódio inaugural publicado, mas a vitória no Call to Action não é, necessariamente, elemento condicionante para que Splendor Blues continue viva. “Se conseguirmos ficar entre os selecionados, poderemos continuar com a série nas condições ideais para todos os envolvidos”, afirma Marcelo. Mas se a recepção geral do público para este piloto for muito positiva, ele acredita que haja outras possibilidades de financiar a série. “Toda a equipe está empolgadíssima para continuar contando essa história”.

Aliás, o roteirista diz que a experiência de criar para um novo formato foi muito interessante, complicada e divertida. “Em breve (provavelmente em setembro), eu e o Zé devemos lançar uma nova Webtoon para o público adolescente, aproveitando toda essa nova gramática que aprendemos com o Splendor Blues. Quem quiser conferir, vale a pena seguir meu perfil de artista no Webtoon, assim quando a nova série sair, você fica sabendo e acompanha”.

Vale lembrar que o piloto de Splendor Blues está disponível gratuitamente em português e inglês. Dá pra ler baixando o app do Webtoon ou direto do seu navegador – basta ACESSAR AQUI.

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