Eldorado é um Edu Falaschi menos Angra e mais Almah. Só que…
Em busca de personalidade própria em sua carreira solo, cantor entrega uma produção igualmente impecável, mas numa continuação com muito mais brilho. Legal. Mas podia ir muito mais ALÉM.
Por THIAGO CARDIM
Quem já me lê há algum tempo nas redes sociais ou acompanha meu trabalho aqui no Gibizilla, sabe que sou entusiasta declarado do bom e velho metal espadinha. Isso não deveria, na real, ser novidade pra ninguém. Portanto, também não deveria ser novidade que, de alguma forma, eu estivesse deveras empolgado por “Vera Cruz”, lançado em 2021. Primeiro disco solo do vocalista Edu Falaschi com repertório inédito, um álbum conceitual, ambientado na época do descobrimento do Brasil… Puro suco da espadinha, eu diria. Pois eu estava empolgado mesmo. Mas deixei de ficar assim que escutei o álbum. ¯\_(ツ)_/¯
É, eu sei, talvez este que vos escreve seja minoria entre os apreciadores de power metal, que em sua grande parte simplesmente AMARAM este Edu pós-Angra. Mas simplesmente não me pegou. Assim, vejam: é uma produção lindíssima, toda épica e pomposa, com uma banda de apoio cirúrgica. Não chega a ser um disco RUIM. Mas é simplesmente óbvio demais. Soa o tempo todo como uma tentativa de continuação de “Temple of Shadows” (2004), o grande êxito de crítica de sua fase à frente do Angra – só que uma continuação extrapolada. Tudo é maior, mais intenso, mais rápido, quase como um filhote do Angra com o Dragonforce. Em certo ponto, fica cansativo até pra mim… 🙁
Mas o sucesso da história de “Vera Cruz” fez com que ele seguisse uma tradição da cultura pop. E a história se tornasse uma trilogia. E eis que agora, em 2023, sai “Eldorado”, a continuação, que leva nosso protagonista para o que hoje é o México. Em meio à temática da cultura asteca, Falaschi conta um novo capítulo da aventura de Jorge. E também tenta contar um novo capítulo de sua própria trajetória artística.
O Caminho para Eldorado
Veja, uma coisa que dá pra dizer sobre “Eldorado”, de fato, é que ele é uma evolução de “Vera Cruz”. Isso tá claro. A produção continua igualmente incrível, de cair o queixo. Mas, ao contrário de seu antecessor, ele tem uma sonoridade que lembra menos o Angra. Tem um pouco do DNA ali, tá bom, e isso era meio que inevitável (afinal, além de Edu, tem Aquiles Priester e Fábio Laguna na formação). Mas é um disco que tenta fugir do Angraverso rumo, talvez, ao Falaschiverso.
“Eldorado” soa bem mais Almah, a banda paralela que Edu comandava quando ainda era frontman do Angra, do que o grupo que o alçou ao estrelato. Aqui, as músicas pisam no freio, evitam a pirulitagem extrema e se esmeram, em grande parte, muito mais na melodia e menos nos malabarismos instrumentais, o que já é uma excelente notícia, pra começar.
Tal qual acontece com “Vera Cruz”, a nova bolacha traz um Edu mais tranquilo nos vocais, em sua zona de conforto, sem precisar explodir seus limites como acabou sendo forçado a fazer no Angra, o que naturalmente geraria aquele conhecido problema nas cordas vocais com o qual o músico lutou durante algo tempo. Plenamente recuperado, ele canta limpo, depois arrisca uma pegada mais agressiva, mas sempre soando mais Edu Falaschi do que um Andre Matos wannabe. Ao seu lado, os guitarristas Diogo Mafra e Roberto Barros brilham, mas o grande destaque é de fato Raphael Dafras, cujo baixo está bem mais evidente, vibrante, na cara. É o seu groove que conduz grande parte da linha mestra da obra.
Quando a gente escuta a maravilhosa “Señores Del Mar (Wield The Sword)”, que abre os trabalhos, claro que aquele refrão gruda na cabeça de imediato. Mas o principal acerto é abrir espaço para José Andrëa, a voz lendária de uma das mais importantes bandas de metal cantado em espanhol, Mägo de Oz. Ali, Edu se desafia pra valer e coloca um interessante sabor hispânico na canção, sem perder a característica porradeira que o tornou ícone metalístico. Mas tem pouco deste tipo de mistura ao longo do disco, o que é uma imensa oportunidade desperdiçada. Seria, aliás, a chance de vermos Falaschi dar ainda mais a sua assinatura para esta nova fase, se distanciando cada vez mais de um Angra cada vez mais prog.
Por mais que a faixa “Q’equ’m” traga a lindíssima voz de Sara Curruchichi, cantora e compositora indígena guatemalteca que canta em kaqchikel, língua materna originária da civilização maia, é difícil chamarmos isso de acerto. Afinal, a canção é curtíssima, servindo mais como uma espécie de introdução para a tradicional (e boa até, vejam) “Reign of Bones” do que qualquer outra coisa. Tinha espaço para ser maior, ampliando possibilidades criativas. E tinha espaço para muito mais dela ao longo do álbum, como um todo.
Aliás, por falar em “Reign of Bones”, tanto esta quanto a ritmada e cavalgada “Sacrifice” talvez tivessem sido escolhas mais interessantes para o primeiro single do álbum do que a óbvia “Tenochtitlán” – um power metal padrãozinho, em altíssima velocidade, que parece conversar até mais com “Vera Cruz” do que efetivamente com o seu sucessor. Dava pra dizer que qualquer boa banda do cenário espadinha que explodiu nos anos 1990 poderia tê-la gravado, aliás…
Se tem uma coisa, no entanto, que carrega o carimbo claríssimo de Edu Falaschi em “Eldorado” são as baladas. Isso é a grande especialidade dele, vamos ser honestos. Enquanto “Empty Shell”, numa adorável breguice, é ótima mas soa um tanto deslocada tematicamente por se tratar de uma power ballad tipicamente anos 1980 (dá até pra imaginar um clipe na vibe Hollywood Rock), “Suddenly” é aquela típica canção de coração rasgado, pra cantar na sofrência, quase como uma irmã gêmea de “Bleeding Heart” (certeza que o Calcinha Preta está de olho…).
No fim das contas, “Eldorado”, o disco, pode ser claramente refletido em “Eldorado”, a canção que carrega o mesmo nome do álbum. Maior faixa da produção, com seus longos 10 minutos de duração, ela é no geral bem boa. Ok. Mas tem pedaços que funcionam mais (em especial aqueles que soam mais “experimentais”, fora da casinha), outros que funcionam menos (quando vira só um combo de pedal duplo e guitarras cantantes)… Musicalmente, tinha potencial de ser não só a melhor do disco, mas também uma das melhores da carreira solo do Edu. Entendeu o paralelo?
Falando da trilogia como um todo, se “Vera Cruz” é competente e só, enquanto “Eldorado” já tem um pouco mais de sabor e deixa minimamente a emoção empatar com a técnica, digamos que dá pra esperar que o disco que encerra a saga seja um passo ainda mais interessante nesta evolução. Que esta trilogia traga, no apagar das luzes, um Edu sendo cada vez mais Edu e cada vez menos o que o público padrão espera dele.
Em tempo: se você quiser saber mais a respeito da HISTÓRIA do disco, vale assistir a este vídeo conceitual do canal Heavy Talk. Recomendadíssimo.
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Bruno
Baita Review, sigo bem sua linha! o Eldorado claramente foi uma evolução em relação ao Vera Cruz!
Parabéns! abs